16/02 - 12:51 Priscilla Borges, iG Brasília
Especialistas defendem inclusão dos temas nos currículos de todas as escolas do País e alertam: professores não são preparados para lidar com o tema.
Mais do que ensinar conteúdos de Português, Matemática ou Geografia, a escola tem a grande tarefa de formar cidadãos. Por isso, especialistas defendem a inclusão de educação sexual nos currículos escolares das crianças e dos adolescentes brasileiros de forma sistemática, a exemplo do que ocorre fora do país. Mas fazem um alerta: primeiro, será preciso formar professores capazes de lidar com o tema.
A partir do ano que vem, todos os colégios da Inglaterra terão obrigatoriamente de incluir o tema nas aulas para crianças com mais de 7 anos. A ideia do governo inglês é que elas tenham informações sobre as mudanças do próprio corpo, os riscos de uma gravidez indesejada e aprendam a identificar possíveis violências e abusos sexuais. Com isso, o governo espera aumentar a prevenção desses casos. Na Holanda, isso já acontece com os alunos de cinco anos.
No Brasil, não há determinações para que a educação sexual faça parte dos currículos escolares. Há, sim, recomendações. Nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), documentos elaborados em 1997 para orientar as escolas a montar as grades curriculares dos alunos de toda a educação básica, há um livro dedicado exclusivamente ao tema. Na introdução, fala-se da importância de se incluir a “Orientação Sexual como tema transversal nos currículos”.
Cada colégio, a partir daí, tem a liberdade de inserir o tema em sala de aula da forma que considerar mais eficaz. O documento enumera conteúdos a serem trabalhados com os alunos, já a partir das séries iniciais do ensino fundamental. Recomendam que as informações abordem tanto as transformações do corpo quanto os aspectos sociais e culturais, por exemplo, que envolvem a sexualidade. Os PCNs são claros ao afirmar que os aspectos biológicos do tema não devem ser os únicos tratados nas aulas.
Apesar de tudo isso, os especialistas afirmam que a educação sexual nas escolas brasileiras está longe do modelo ideal. “Coletivamente, a educação sexual deve ser abordada a partir do 5° ano do ensino fundamental. Mas antes disso deve ser abordada individualmente, de acordo com a curiosidade de cada criança”, opina Cláudia Bonfim, doutora e pesquisadora pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
O mais importante para Cláudia, que é também vice-presidente da Associação Brasileira de Educação Sexual (Abrades), é ampliar a abordagem feita hoje na escola e pela sociedade, que banalizou o tema na visão dela. “Quando se fala do tema na escola é sempre sobre as doenças sexualmente transmissíveis, a gravidez indesejada” comenta.
Para ela, é preciso mostrar aos estudantes, além disso, que a sexualidade faz parte da natureza e da cultura do ser humano. “Precisamos abordá-la de forma natural, conscientizando os adolescentes que ela exige maturidade física, psicológica e tem tempo certo para acontecer”, afirma.
Além disso, é importante que a educação sexual seja trabalhada por todas as escolas. “A criança e o adolescente têm direito à saúde e à educação. Para isso, eles precisam de informação. Precisamos desmistificar a educação sexual. Falar disso, não é falar de sexo explícito”, ressalta a professora do Departamento de Enfermagem da Universidade de Brasília, Regina Griboski. Ela lembra que os conhecimentos sejam repassados aos estudantes de acordo com a maturidade deles. E defende a participação familiar nessa tarefa de orientação.
Resistências e entraves
Para que a educação sexual seja uma realidade nas escolas brasileiras, é preciso superar a resistência da sociedade e a falta de preparo dos educadores. “A família condicionada pela visão histórica da sociedade patriarcal e dogmática, não tem, em sua maioria, contribuído para a educação sexual”, critica Cláudia. A especialista ressalta que muitas famílias preferem ignorar o tema em casa. “A família precisa se reeducar também”, diz.
Para Cláudia, a sociedade tem de reconstruir valores: acabar com o preconceito, combater a homofobia, rediscutir os papéis do homem e da mulher no mundo. Por isso, as mudanças nas escolas e nas famílias são tão necessárias. “Ao mesmo tempo em que o país precisa criar políticas específicas para a área, precisamos investir na formação do professor. Esse é um entrave para a entrada do tema nos currículos”, completa Rejane.
Durante o doutorado na Unicamp, Cláudia analisou a formação dos professores da educação básica e constatou: eles não estão preparados para lidar com a educação sexual de forma completa em sala de aula. Durante a graduação, eles são formados apenas sobre os aspectos biológicos. As dimensões psicológicas e sociais que envolvem o tema são colocadas de lado.
A especialista defende a necessidade de se criar disciplinas sobre o assunto para professores de Biologia, Pedagogia e Licenciaturas antes mesmo de incluí-las nos currículos dos alunos. “Não podemos desconsiderar a importância do conteúdo biológico, que é fundamental. Mas ele não é suficiente para superar as problemáticas atuais da sociedade”, comenta.
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