Vivenciando a Cidadania

Nosso objetivo é falar sobre diversidade,

vivenciando a cidadania

dentro da escola,


trabalhando a participação

na vida em sociedade,


fazendo com que nossos alunos

cresçam sujeitos de
direitos

e deveres tendo condições

de serem cidadãos
ativos.



Vencendo estereótipos



Maio 2002
Coisa de menino. Coisa de menina. Será?
Mesmo sem perceber, você pode estar tratando alunas e alunos de forma diferenciada. Veja aqui como evitar estereótipos
Meninos são bagunceiros, gostam das aulas de Matemática e se dão melhor nos esportes. Meninas são organizadas, se destacam em Língua Portuguesa e Arte e têm mais disciplina. Quantas vezes você já não ouviu, disse ou pensou uma dessas frases? Várias, certo? Mas será que é isso mesmo? Esses conceitos, tão comuns em nosso cotidiano, expressam, na verdade, estereótipos sobre masculinidade e feminilidade. São heranças culturais transmitidas pela sociedade (família, amigos, professores). O que não quer dizer que seja a verdade absoluta. Ao contrário.
A natureza não determina que as moças devam lavar a louça e os rapazes, o carro. Nem que elas têm o direito de chorar em público e eles não. E na escola? Só as garotinhas podem manter os cadernos arrumados, com a letra impecável? Idéias assim não passam de estereótipos. Tratá-las como verdades imutáveis, ainda mais num local onde jovens personalidades estão apenas começando a se formar, pode ser um erro com uma conseqüência nefasta: a difusão de preconceitos. Ao reproduzir modelos, você pode, sem querer, estar podando habilidades, tolhendo talentos.
As diferenças entre os papéis atribuídos a homens e mulheres são estudadas há pelo menos 20 anos e conhecidas como relações de gênero ou gênero. "É essencial analisar os relacionamentos e o viver", explica Rosa Ester Rossini, pesquisadora do Núcleo de Estudos da Mulher e Relações Sociais de Gênero da Universidade de São Paulo (USP).
Infelizmente, ainda são poucos os colegas que discutem o assunto na sala dos professores e em classe. Os problemas, muitas vezes, começam na dificuldade de perceber (e avaliar) a própria postura. Em casa, na nossa família, os modelos são apresentados como prontos. "E precisamos acordar para a necessidade de discuti-los diariamente", diz Elenita Pinheiro de Queiroz Silva, mestranda em Educação e Gênero pela Universidade Federal da Bahia.
Sim, muitos alunos continuarão chegando à sala de aula com idéias preestabelecidas, como o pai deve ser forte e a mãe, meiga e delicada. É aqui que você entra em cena (leia no quadro algumas sugestões de como agir no dia-a-dia, abaixo). "A educação trazida de casa promove uma série de valores, mas nem sempre eles apontam para o melhor caminho", defende Yara Sayão, do Serviço de Psicologia Escolar da USP. "Se não fizermos nada, não daremos oportunidade para que as habilidades individuais apareçam."
Trabalhar relações sociais é mostrar que as pessoas são diferentes, que as culturas são diferentes, que a realidade do campo e da cidade é diferente, que o mundo é diferente... Na Escola de Aplicação da Faculdade de Educação da USP, docentes e orientadores pedagógicos conseguiram transformar os pais em aliados e criar espaços de integração. Nas reuniões, o corpo docente incentiva as famílias a definir tarefa extraclasse para os alunos: comprar pão todos os dias, alimentar o cachorro, arrumar a cama, lavar a louça. Assim, a criança começa a entender que também é responsável pelo lugar onde vive e que pode desempenhar diferentes papéis. O trabalho prossegue no colégio. Nas aulas de Educação Física, todos realizam as atividades juntos. Pode ser um jogo de futebol com times mistos ou um ensaio de uma dança popular.
Como agir em sala de aula:

• Revertam expectativas em torno dos papéis de gênero: peça que uma menina carregue uma caixa de livros e que um menino sirva o lanche.

• Permita que meninos e meninas realizem todo tipo de atividade: cozinhar, costurar, fazer consertos, brincar com bonecas, jogar bola.

• Proponha às garotas tarefas "incomuns", como trabalhar com peças e ferramentas de marceneiro.

• Estimule as meninas para a Matemática e as Ciências e os meninos para a Arte.

O ideal é desenvolver atividades nas várias áreas, mas é possível trabalhar isoladamente, em cada disciplina. Patrícia* leciona História na rede estadual de Feira de Santana, interior da Bahia, e para falar de relações de gênero em sala de aula, usa o próprio exemplo. Ela é a chefe da família. Realidade cada vez mais comum no Brasil de hoje, a professora há 24 anos sustenta a casa com seu salário. O marido está desempregado e, obviamente, lava e passa roupa, cozinha, varre o chão, tarefas historicamente tidas como femininas. Em classe, ela discute o papel do feminismo e a importância da mulher na família e no mundo. "Comparamos as sociedades antigas com a realidade de hoje", conta.
A professora só frequentou a Faculdade de Estudos Sociais depois de casada. Recebia o crédito educativo e conciliava dois empregos para pagar as contas. Prestes a se aposentar, ela não esconde o orgulho de ter conseguido criar os cinco filhos com o próprio dinheiro as três moças, inclusive, chegaram à universidade. Apesar de não haver nada de errado com essa situação, o preconceito ainda fala mais alto. Patrícia é um nome fictício, pois ela não quer ser identificada.
Quando se fala em diferenciação entre sexos, isso não significa que os meninos estejam sempre em vantagem. Eles também são discriminados. Principalmente nas séries iniciais, em que letra bonita e caderno caprichado são sinônimos de bom aluno ou, na opinião de muitos professores, de boa aluna. Em geral, essas características são mais comuns às meninas e os pequenos acabam rotulados de desorganizados. Se tentarem caprichar no caderno, o julgamento pode até piorar. Tudo porque falta preparo para enfrentar situações que fogem aos modelos tradicionais.
O que fazer quando o garoto insiste em participar da roda delas, ou quando ela não se encaixa no rótulo de bonequinha? "Todos devem ser livres para entrar no grupo preferido e jogar o que quiserem", explica Rosa Rossini. Em outras palavras: menino brincando de boneca? Pode, é claro. Menina que quer ser o pai na dramatização? Também pode. É bobagem imaginar que isso venha a determinar uma opção sexual no futuro. Na verdade, só estimula a compreensão de que papéis de gênero são mutáveis.
Veja o que aconteceu num colégio de Belo Horizonte. Maurício*, aluno do Ensino Fundamental, era acusado de homossexual pelos colegas porque estava sempre no grupo das garotas. A pressão era tanta que ele se isolou. Preocupados, os pais procuraram um psicólogo, que sugeriu a transferência de turno o que foi feito no início deste ano.
Para evitar que o quadro se repetisse na nova turma, a equipe pedagógica se preparou. Nas aulas de Filosofia, foram criadas dinâmicas e atividades de grupo para discutir temas relacionados ao respeito pelos outros. Com isso, a escola está proporcionando um ambiente saudável para Maurício e ensinando como é importante aceitar as diferenças.
Guacira Lopes Louro, doutora em Educação e autora de vários livros sobre relações de gênero, diz que é preciso que essas situações sejam encaradas sem medo. Ela explica que a intolerância se manifesta de diferentes formas: na linguagem usada em sala, nas piadas e no deboche. O silêncio e a não-interferência, porém, podem ser ainda piores. "Aceitar passivamente que um garoto que se nega a entrar numa briga seja chamado de bicha é alimentar preconceitos", ensina. "Estamos agindo como se fosse natural que os homens resolvam divergências por meio da disputa física."
Perceber que essa diferenciação existe nem sempre é fácil (faça o teste, no final dessa reportagem). Vivemos num tempo de grandes mudanças comportamentais e muitos avanços nas relações sociais. Turmas separadas por sexo é coisa do passado. Mas o que fazer quando os próprios alunos promovem uma separação por sexo? Em Feira de Santana, a professora Adriana Estrela Santos enfrentou, há três anos, uma situação dessas. Ela começava um estágio, no Colégio Estadual Ernesto Carneiro Ribeiro, e a turma de 6a série era dividida com meninos de um lado, meninas do outro.
Com ajuda de Elenita Pinheiro, sua orientadora, Adriana descobriu o que estava motivando aquela atitude: enormes diferenças de interesses. A saída foi mostrar aos adolescentes o que eles estavam perdendo. Aos poucos, ela foi quebrando o gelo e incentivando a interação. As aulas se tornaram mais ricas e os jovens fizeram novas amizades. "É comum que se formem grupos, mas é preciso estar atento para impedir que eles virem grupinhos", ensina Elenita.
Mudar de comportamento e adotar uma postura comprometida com a difusão da igualdade e do respeito à diferença é mais fácil do que pode parecer à primeira vista (leia o quadro). Basta querer. No dia-a-dia, reflita, pense, compartilhe opiniões com os colegas e os alunos. Todos só têm a ganhar. O resultado é um mundo mais rico, com jovens mais abertos e solidários. Exatamente o que se espera de um bom educador.

*Os nomes foram trocados a pedido dos entrevistados


Autoavaliação: eu estimulo a igualdade?

As perguntas a seguir, preparadas pelo Núcleo de Estudos da Mulher e Relações Sociais de Gênero, ajudam a avaliar como cada um de nós se comporta. Leia e pense: "Como eu reajo diante das situações citadas?" Registra suas respostas e mantenha a lista num lugar visível para que você reflita constantemente sobre suas atitudes.

- Eu peço que meninos e meninas executem tarefas cotidianas em sala de aula, tais como abrir janelas, decorar as paredes ou operar um equipamento?

- Eu intervenho quando as meninas, ao trabalhar em grupo com os meninos, são relegadas a cargos estereotipados?

- Eu incentivo meninas e meninos a praticar esportes, mas respeito quem não gosta?

- Eu compreendo que o preconceito de gênero não é um problema individual, mas de toda a sociedade?

- Eu aceito críticas a respeito do meu comportamento?

- Quando os alunos fazem piadas sexistas ou racistas, explico por que não são corretas?

- Eu procuro não fazer comentários e piadas sexistas?

- Na decoração da minha sala de aula uso imagens masculinas e femininas?

- Eu faço as mesmas perguntas aos meninos e às meninas?

- Eu uso o mesmo tom de voz com todos, independentemente do sexo?

- Eu desencorajo a competição entre os sexos?

- Eu destaco o sucesso de mulheres tanto quanto o de homens?

- Eu promovo a leitura de textos escritos por mulheres?

Quer saber mais?

Colégio Estadual Ernesto Carneiro Ribeiro, Conj. Feira IV, CEP 44085-060, Feira de Santana, BA, tels. (75) 223-5636 e 223-613
Escola de Aplicação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, Av. da Universidade, 220, trav. 11, CEP 05508-900, São Paulo, SP, tel. (11)3091-3503 begin_of_the_skype_highlighting              (11)3091-3503      end_of_the_skype_highlighting (11)3091-3503 (11)3091-3503  (11)3091-3503.
Núcleo de Estudos da Mulher e Relações Sociais de Gênero (NEMGE/USP), Prédio da Antiga Reitoria, 3º andar, sala 310, CEP 05508-900, São Paulo, SP, tel. (11) 3091-4180 - (11) 3091-4180

BIBLIOGRAFIA

Dossiê Gênero e Educação, in Revista Estudos Feministas, vol. 9, no 2, vários autores, e-mail: ref@cfh.ufsc.br, tel. (48) 331-8211, 25 reais
Ensino e Educação com Igualdade de Gênero na Infância e na Adolescência - Guia Prático para Educadores e Educadoras, NEMGE, 54 págs., Edusp, tel. (11) 3091-4180 - 17 reais
Gênero, Sexualidade e Educação, Guacira Lopes Louro, 180 págs., Ed.
Vozes, tels. (11) 6693-7944 - 20,60 reais


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